domingo, 7 de fevereiro de 2010

O Natimorto, de Paulo Machline

Por Cristian Rangel


Quando se trata de adaptações literárias para o cinema, inevitavelmente todos tratam de comparar as duas obras, qualificando uma em detrimento da outra. No entanto, devemos considerar a distinção que há entre as duas formas de linguagem, para se fazer ponderações mais conscientes sobre elas. O limite entre fidelidade a obra original e criação a partir dela, também é uma questão que merece bastante atenção, porém, creio que se tratando de adaptações é importante verificar se elas sobrevivem e se resolvem, independente uma da outra.


1º longa de Paulo Machline na direção, O Natimorto é uma adaptação do romance homônimo do quadrinista e escritor Lourenço Mutarelli, e teve sua pré-estréia nacional na 13ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Paulo Machline é fiel ao ambiente pesado e um tanto quanto obscuro da obra de Mutarelli, mas deixa um pouco de lado o humor sarcástico, elemento também característico da obra do escritor, para mergulhar profundo na loucura e fumaça da história.


Um caça-talentos traz uma cantora a São Paulo para apresentá-la a um maestro, enquanto esperam a audição em um quarto de hotel, ele, que fuma um maço de cigarros por dia, faz uma interessante relação com as campanhas anti-fumo dos maços e as cartas do tarô, sendo assim, em sua lógica ele prevê o seu dia a partir das imagens das campanhas. Ao se apaixonar pela a cantora (a voz da pureza) ele propõe a ela que passem cinco ou seis anos trancados naquele apartamento sem sair para nada.


O filme nos apresenta uma visão bastante pessimista, as coisas nunca dão certo, são apenas expectativas não saciadas. Tudo se passa no quarto de hotel, o mundo faz parte de um extra-campo obscuro, onde podemos ver seus fragmentos através de flash back’s de um passado, no mínimo, sórdido. O casamento do Agente não deu certo, sua proposta não saiu como ele queria, a audição da Voz não acontece como desejava e o novo relacionamento entre os dois também não dá certo. O filme pode ser visto como uma metáfora do homem e da mulher em relação ao mundo, impressão acentuada pelo fato dos personagens não terem nomes próprios (sendo o Agente, A Voz e a Esposa, que fazem parte de um triangulo amoroso onde todos são distante, mesmo dividindo um mesmo espaço). Ele se fecha em suas certezas e também naquele quarto, com o seu olhar niilista para com o mundo, sempre querendo que entrem no seu jogo esquizofrênico; enquanto ela não se contenta em ver as coisas com os olhos dele, carregando consigo certa esperança e se lança para fora, se arrisca; no entanto, lá fora, o mundo lhe é cruel e o quarto permanece como refugio contra a frieza da vida lá fora e também contra os monstros particulares. E mesmo sabendo que a nicotina pode causar impotência sexual, continuam acendendo mais um cigarro.


O Natimorto é daqueles um filme que, pode-se dizer não possuir tempo de duração, pois permanece mesmo depois de sua exibição, por um tempo na mente do espectador, independente de se gostar ou não dele, tem a força de nos instigar e também é de difícil digestão, quer nos confrontar e requer uma analise mais atenciosa de seus pequenos detalhes.



Trailer:

Um comentário:

Taurus disse...

Bacana seu comentário! Me ajudou a formar minha opinião. Vou tentar assistir nos cinemas!!!